Terminou ontem a 84ª edição da Feira do Livro de Lisboa. Curiosamente, para mim foi uma estreia: visitei-a no passado dia 7.
Debaixo do braço uma lista com alguns títulos difíceis de encontrar fora da Feira e, tirada do site, o programa dessa tarde, no que toca a autores e lançamentos de livros. Tive sorte, não há dúvida, já que havia grandes autores e, felizmente, pude trazer livros autografados, depois de trocar breves frases com alguns deles.
Destaco aqui Ondjaki que teve a gentileza de ir ter comigo à fila onde eu aguardava o pagamento de “AvóDezanove e o Segredo do Soviético” e que sorrindo, disse: “entrega ao domicílio”. Tal como afirmei no post anterior, a simpatia e afabilidade deste autor da minha geração surpreenderam-me, tal como o seu sentido de humor.
Na medida do possível percorri os diversos stands e lá fui encontrando a maioria das obras que procurava.
Inevitavelmente fiz a comparação com a tradicional Feira do Livro do Porto e, sem dúvida que o Parque Eduardo VII é uma área gigante com uma grande oferta. Aqui a cidade do Porto fica a perder…
Gostei muito.
Ilustro o artigo com algumas fotografias que considero sugestivas.
A título de curiosidade, poderá ser interessante dizer que em Setembro também teremos Feira do Livro do Porto e que brevemente darei mais pormenores.
Parti para a leitura de “Os Transparentes” com a boa referência de “Quantas Madrugadas Tem a Noite”, outro livro de Ondjaki sobre o qual já falei aqui no Numa de Letra (http://numadeletra.com/9280.html).
Obra vencedora do Prémio José Saramago 2013, é um livro completo.
A escrita é magnífica e aborda temas sérios como a pobreza e a corrupção de uma forma sarcástica e por vezes até, hilariante.
Luanda, terra natal do autor, é a cidade onde toda a acção se passa, o pano de fundo desta história de vizinhos do mesmo prédio, gente simples e anónima.
A construção das personagens começa nos nomes de cada uma como, por exemplo, VendedorDeConchas, CamaradaMudo, JoãoDevagar, o Carteiro, MariaComForça, entre outros, cada um a contar as suas histórias ao mesmo tempo íntimas e colectivas.
Numa cidade que é um misto de modernismo e degradação, fica latente esta constatação, sempre abordada num tom emotivo e extraordinário.
A sensibilidade e a lucidez de Ondjaki também estão bem latentes ao longo de todo o livro, uma obra-prima que recomendo.
P.S.: A título de curiosidade, conheci ontem o autor na Feira do Livro de Lisboa. Ao pedir-lhe que me autografasse um livro, conversámos durante alguns minutos. Fiquei deslumbrada com a transparência do seu olhar, com a simplicidade e afabilidade das palavras, com a gentileza dos gestos.
Ondjaki venceu hoje o Prémio José Saramago com "Os Transparentes".
Deixo-lhe uma pequena homenagem, um excerto de "Quantas Madrugadas Tem a Noite", um delicioso livro sobre o qual já falei no Numa de Letra. O título vencedor ficará para uma próxima oportunidade.
O velho ditado que diz “primeiro estranha-se, depois entranha-se” é um bom exemplo da adaptação desta sabedoria popular a situações do quotidiano. No meu testemunho mais recente, o provérbio enuncia com clareza o que me aconteceu com o livro “Quantas Madrugadas Tem a Noite”, de Ondjaki.
Até há poucos meses, Ondjaki não fazia parte da lista de autores que eu conhecia. Foi por mero acaso, num zapping, que uma mesa recheada de livros, uma parede de fundo a condizer e uma entrevista a sustentá-las me prenderam a atenção e me fizeram ficar a assistir àquele programa televisivo. O entrevistado, fiquei a saber, era Ondjaki, um escritor angolano jovem, simpático, de retórica fluente e interessante.
Gostei da forma como Ondjaki descreveu episódios da vida ligados ao seu percurso literário e outros relacionados com livros que escreveu, já editados.
Mas o ponto mais alto da entrevista foi quando revelou que “Cem Anos de solidão” era o seu livro predilecto. Tal e qual como o meu. Por isso quando a seguir referiu “A Náusea” de Jean Paul Sartre, como outro dos seus livros de eleição, coloquei-o de imediato na lista de prováveis leituras, da mesma maneira que no final do programa, juntei “Ondjaki” ao meu rol de potenciais autores, sem lhe associar um título.
“Quantas Madrugadas Tem a Noite” está acabadinho de ler...
A estranheza inicial que mencionei, prende-se com a linguagem usada por Ondjaki neste livro. Estamos perante uma narrativa contada na primeira pessoa, recheada de dialecto, gíria, calão e até erros ortográficos. Tudo propositado, claro! e a fazer muito sentido - é que nem consigo imaginar o livro escrito de outra forma -.
No final há um Glossário que, diga-se de passagem, é perfeitamente dispensável para se entender o texto.
O narrador, personagem principal do livro, conta a "avilo" (amigo; companheiro) a história do defunto AdolfoDido cujo corpo foi roubado. Uma história com muitos parêntesis pelo meio onde encaixam outras histórias, "os eteceteras que sempre aparecem no meio duma conversa humana", como o próprio narrador diz. Tudo bem regado por "mais uma birra" (cerveja) à custa do "avilo".
“Quantas Madrugadas Tem a Noite” mistura humor, poesia e suspense.
Um romance hilariante com personagens sui generis, como o anão BurkinaFaçam, o albino Jaí ou a KotaDasAbelhas.
Poucas foram as páginas em que não sorri e houve até algumas que me proporcionaram boas gargalhadas.
Um livro divertidíssimo, bem escrito e muito fora do tradicional, leve mas penetrante, de um nome a reter.
55ª exposição internacional de arte
museu nacional soares dos reis
projecto arte de portas abertas
quantas madrugadas tem a noite