Há pouco mais de 1 ano publiquei aqui no blog um post sobre “Todos os Nomes”, o primeiro livro que li de Saramago. Ficou a promessa de voltar a este escritor. Faço-o agora, com “As Intermitências da Morte”.
Reencontrei uma narrativa envolvente e hilariante, onde desta vez a protagonista é a Morte – sim, sim, essa que é representada por um esqueleto e que se faz acompanhar por uma gadanha.
Tudo começa num 31 de Dezembro em que não há registo de óbitos. Os dias vão passando e a situação mantém-se: ninguém morre. A morte de humanos em Portugal, entenda-se. Quanto à restante fauna e à flora, tudo se passa normalmente.
No início é uma alegria generalizada (afinal a vida eterna existe!!) e há até quem comemore o facto colocando a bandeira de Portugal à janela (onde é que eu já vi isto?!...).
Contudo, com o passar do tempo, esta ausência de mortes faz agitar a sociedade, levando à desordem total, à falência de alguns, à sobrecarga de outros, ao lucro de uns tantos, enfim!, a um caos verdadeiramente insuportável.
Neste romance, onde novamente é abordada a condição humana, as palavras e o seu significado são várias vezes mencionados, havendo até interessantes aforismos ligados a elas. Cito alguns exemplos:
Não há nomes próprios nem regras gramaticais, apesar disso a escrita não perde interesse ou valor, até para os conservadores da Língua Portuguesa, como eu.
Foi bom regressar ao sr. José - o personagem principal de “Todos os Nomes” - e aos seus verbetes, numa passagem breve desta narrativa.
O tempo para o blog e para as leituras é que tem sido pouquíssimo...
Ler Saramago é cativante, é um prazer.
O Sr. José, personagem principal de “Todos os Nomes”, é auxiliar de escrita numa Conservatória Geral. Andará na casa dos cinquenta e, para além do trabalho rotineiro, nada de interessante acontece na sua vida.
É um solitário que vive paredes meias com a Conservatória, sem família nem amigos.
Apesar de cumpridor e escrupuloso, nunca subiu um degrauzinho na rígida hierarquia do serviço.
O seu único passatempo é recortar e coleccionar biografias de gente famosa mas, quando no meio das fichas dessas pessoas encontra um verbete de uma mulher comum, foca toda a sua atenção na vida dessa mulher… e a vida do Sr. José transforma-se radicalmente: o humilde funcionário entusiasma-se na procura “do outro”.
Gostei muito desta estreia na leitura de José Saramago.
A escrita, aparentemente complexa, é única. As frases são enormes mas nem por isso fazem perder o fio à meada. Não há aviso ortográfico para os discursos directos, os diálogos simplesmente começam com a maiúscula no correr do texto, sem mudança de linha, sem travessão, sem aspas.
Adorei e ri com o número exagerado de exemplos citados, como esta passagem sobre as colecções do Sr. José: “uma vez que lhe é indiferente que se trate de políticos ou de generais, de actores ou de arquitectos, de músicos ou de jogadores de futebol, de ciclistas ou de escritores, de especuladores ou de bailarinas, de assassinos ou de banqueiros, de burlões ou de rainhas de beleza.” ou uma página quase inteira com definições de como eram constituídos os primeiros monumentos funerários.
Depois há a análise subliminar do autor à condição humana que nos deixa a reflectir.
Voltarei a Saramago, não há dúvida.
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